quinta-feira, 28 de novembro de 2013

A Rainha Adúltera. Joana de Portugal e o Enigma da Excelente Senhora. Marsilio Cassotti. «… o Regente Pedro começara a imaginar para ela um destino brilhante. A futura mãe da futura Isabel, ‘a Católica’ que de virtudes da alma e perfeiçooes do corpo foy en todo compryda…. Rui de Pina, passaria naquela altura a viver em Lisboa com a mãe e a ‘irmã Beatriz, futura duquesa de Viseu’»

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A Rainha Triste
«(…) Um cronista português defende que a mãe de Joana aproveitou o novo poder dos infantes de Aragão para invocar a sua causa. Assim, en esta sombra de prosperydade, em que a Raynha via seus irmaos em Castella, tomou tanta confyança pera seu recurso, que nom quis aver por bom nenhum meo, que de Portugal sem o regimento, e criaçam d'el Rey lhe fosse cometido. Mas a luz que projectavam os seus irmãos não iluminava as suas irmãs do mesmo modo. Devido a isso, é muito provável que a relação entre a rainha Leonor e a irmã se tivesse deteriorado, uma vez que a segunda viu cumprido o seu objectivo de afastar o valido da corte, e a primeira foi-se apercebendo que o cunhado castelhano não cumpria a promessa de a ajudar a resolver os seus problemas portugueses. Na realidade, quando em finais de 1441, a mãe de Joana voltou a encontrar-se com o rei em Valladolid, a situación permanecia num impasse, apenas alguma actividade diplomatica e troca de embaixadas entre Castela e Portugal, com o objectivo claro de dilatar qualquer intervençao militar. No final de Fevereiro de 1442, os procuradores das Cortes, reunidas em Évora, decidiram o destino da mãe de Joana, ordenando a confiscação dos seus bens e proibindo a sua entrada em Portugal. Na mesma altura, o Regente atribuiu ao conde de Barcelos o título de duque de Bragança, o primeiro dos quatro prestigiosos títulos ducais ibéricos que devem a sua concessão a acontecimentos directamente relacionados com a rainha Leonor, a sua filha Joana e a sua neta, a Excelente Senhora. A partir de então o novo duque não mais voltaria a sair em defesa da exilada.
O canto do cisne da consorte portuguesa aconteceu durante as Cortes castelhanas reunidas, entre Maio e Julho daquele ano, em Valladolid. O rei de Castela permitiu que a rainha se deslocasse a essa cidade para expôr o seu caso perante os procuradores, apesar de nas suas costas boicotar as embaixadas enviadas a Portugal pelos infantes de Aragão, que elles fingiam ser já derradeira, ameaçando que se as tareias da rainha não se resolvessem segundo a sua exigência, o último passo seria a guerra entre os reinos. Após este efémero consolo, a esperança de prosperidade da mãe de Joana foi-se tornando cada vez mais pequena, na mesma medida em que o rei de Castela, habilíssimo dissimulador, adquiria a garantia de que o valido Álvaro de Luna, com quem permanecia em comunicação secreta, regressaria à corte. É impossível seguir o rasto de Leonor e Joana durante alguns meses, a partir do encerramento das Cortes de Valladolid, em Julho de 1442. Certamente que não se encontravam na corte, perto do rei, nem no mosteiro de las Dueñas de Medina del Campo. Talvez tivessem regressado a Arévalo, juntamente com a rainha María, pois seria aí que, já a meio do Outono, os infantes de Aragão assinariam um novo pacto com a rainha María e o príncipe Enrique para acabar definitivamente com Álvaro de Luna. Um acordo que, segundo um biógrafo do príncipe, incluía ambiciosos projectos em Portugal, que também fracassariam, graças ao jogo duplo do rei de Castela. Nessa mesma altura, em Alcácer do Sal, feudo alentejano do infante João, irmão do rei Duarte I, morria, vítima de febre dos pântanos (malária crónica), o duque de Beja, cunhado mais novo de Leonor, cuja filha mais velha, uma jovem de treze anos chamada Isabel que a partir de então ficara sob a guarda da sua mãe, Isabel de Barcelos, primogénita do novo duque de Bragança, desempenhara um papel alheio à sua vontade nas desgraças da exilada rainha de Portugal. No entanto, esta jovem não se afastaria do olhar do Regente.
Conta-se que o Regente Pedro começara a imaginar para ela um destino brilhante. A futura mãe da futura Isabel, a Católica que de virtudes da alma e perfeiçooes do corpo foy en todo compryda, segundo Rui de Pina, passaria naquela altura a viver em Lisboa com a mãe e a irmã Beatriz, futura duquesa de Viseu. Em finais de 1442, os infantes de Aragão reuniram-se com Alvaro de Luna na imponente fortaleza de Escalona, domínio toledano do condestável. Essa reunião foi um novo golpe para as aspirações de D. Leonor de regressar triunfadora a Portugal com a filha. Como também o seria o triunfo diplomático seguinte do seu cunhado Pedro na Santa Sé, que reforçaria o seu papel como regente enquanto responsável em realizar, a partir de Ceuta, única cidade que confessa o nome de Cristo em Africa, a terceira parte do mundo, uma política de conquista de territórios infiéis, postos imediatamente sob a
tutela espiritual da Igreja romana». In A Rainha Adúltera, Joana de Portugal e o Enigma da Excelente Senhora, Crónica de uma difamação anunciada, Marsilio Cassotti, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-405-5.

Cortesia da Esfera dos Livros/JDACT