terça-feira, 8 de agosto de 2017

Memórias de Agripina. Pierre Grimal. «Não fiquei convencida de que o meu irmão me dissera a verdade. Que poder extraordinário tinha esse governador da Síria…»

jdact

O Tempo de Meu Pai
«(…) Quando o meu irmão e eu tivemos esta conversa, tínhamos chegado à colina de Claro, na costa, e Germânico disse casualmente, à nossa frente, que no dia seguinte iria ao templo de Apolo orar ao deus. Sabes, disse-me Caio, quando estávamos sós, ele vai consultar o oráculo! Que o meu pai desejasse conversar com os deuses, não me espantava. Não era ele da raça deles? Os deuses só podiam querer-lhe bem, sobretudo aquele Apolo, que falava em Claro, e que eu conhecia bem, pelo templo que lhe mandara construir Augusto, não muito longe da nossa casa, no Palatino. Daquele encontro só podiam resultar boas coisas. Todavia, à noite, quando o nosso pai regressou, tinha um ar preocupado. A minha mãe interrogou-o, mas ele respondeu evasivamente. Que soubeste?, perguntava ela oh, nada de especial.
E para além disso? Tu sabes como são todos os oráculos. Palavras ocas, frases obscuras e tudo isso em verso, e nem sequer belos ou simétricos. Ela não conseguiu fazê-lo dizer mais, mas sentia, como eu, que ele estava inquieto, que o oráculo não fora assim tão impreciso e insignificante como Germânico queria fazer crer. Assim que parámos em Éfeso e em Mileto, os Gregos que estavam connosco vangloriavam-se das maravilhas. Germânico tinha pressa de chegar a Rodes. Estávamos quase no Verão. Fazia bom tempo no mar e cruzávamo-nos constantemente com navios. Um dia, ouvi a minha mãe dizer: o outro não deve estar longe! Quem era esse outro, ao qual não se chamava pelo seu nome? Foi Caio quem mo revelou, naturalmente. Uma noite disse-me: não sabes por que não paramos? Tu não sabes, mas eu sei, e não to vou dizer. Devo ter implorado durante muito tempo, prometendo nada dizer a ninguém. Por fim, ele anuiu em falar: aquele que deve vir é o novo governador da Síria, e nem a mãe nem o pai gostam dele. A sua voz tornou-se um sussurro: creio que têm medo dele! Fiquei incrédula, porém um pouco inquieta. Os meus pais, esses seres todo-poderosos, o meu pai a quem toda a gente tratava com o maior respeito, que comandava todos aqueles soldados, todos aqueles marinheiros que pareciam ter nascido somente para o servir, como podia ele ter medo, e de quem?
Não fiquei convencida de que o meu irmão me dissera a verdade. Que poder extraordinário tinha esse governador da Síria, desse país cujo nome eu ouvira pela primeira vez e para o qual, segundo me dissera Caio, nos dirigíamos? Estava ele, também, em relação com os deuses?» In Pierre Grimal, Memórias de Agripina, Lyon Edições, Romances Históricos, 2000, ISBN 972-8461-51-8.


Cortesia Lyon E./JDACT