sábado, 16 de setembro de 2017

As prostitutas na História. Patrícia Pereira. «O médico vai dizer que a mulher não tem muito prazer sexual, ela tem desejo de ser mãe. Já o homem tem e, por isso, precisa da prostituta»

Cortesia de wikipedia e jdact

As primeiras prostitutas da história. Demóstenes
«(…) Havia bordéis públicos, pequenos bordéis privados e também casas de tolerância, os banhos públicos. Além disso, continuavam a existir as prostitutas que trabalhavam nas ruas. Em tese, o acesso aos prostíbulos públicos era proibido para homens casados e padres, mas eles encontravam meios de burlar a legislação. Rossiaud escreve que as prostitutas não eram marginais na cidade, mas desempenhavam uma função. Nem eram objecto de repulsão social, podendo, inclusive, ser aceitas na sociedade e casar-se depois que deixassem a vida de prostituta.
A liberdade sexual só era tolerada para os homens. As mulheres casadas e suas filhas, de boa família, deviam temer a desonra. Mas, de acordo com Rossiaud, essa liberdade masculina não sobreviveu à crise do Renascimento. Houve uma progressiva rejeição da prostituição, que revelava nas comunidades urbanas a precariedade da condição feminina. Lentamente, a mulher conquistou uma parte do espaço cívico, adquiriu uma identidade própria, tornou-se menos vulnerável, explica Rossiaud. E houve uma revalorização do casal.
Prostituição e violência aparecem pela primeira vez associadas, devido a brigas, disputas e assassinatos nos locais públicos. Autoridades municipais, apoiadas pela igreja, passaram a coibir a prostituição que, a partir de então, aparecia como um flagelo social gerador de problemas e de punições divinas, afirma Rossiaud. Um após outro, os bordéis públicos foram desaparecendo. A prostituição não desapareceu com eles, mas tornou-se mais cara, mais perigosa, urdida de relações vergonhosas, diz Rossiaud. Para o autor, foi o duplo espelho deformante do absolutismo monárquico e da Contra-Reforma que fizeram parecer decadência escandalosa o que era apenas uma dimensão fundamental da sociedade medieval.
A prostituição nas cidades é como a fossa no palácio: tire a fossa e o palácio vai-se tornar num lugar sujo e malcheiroso. Na modernidade, segundo Margareth Rago, autora de Os Prazeres da Noite, a prostituição ganhou feições diferenciadas. Isso porque as mulheres conquistam maior visibilidade e actuação na sociedade. Surgiram novas formas de sociabilidade e de relações de género, com a criação de fábricas, escolas e locais de lazer e consumo. Foram outros modos de vida, nos quais a mulher vai ter maior participação, diz Margareth. Apesar da modernização dos costumes, a sociedade ainda é conservadora em relação às prostitutas.
Nesse contexto, nasceu o feminismo e a mulher reivindicou o direito de trabalhar e de estudar. O discurso sobre a prostituição ficou forte nesse período e virou debate médico e jurista. Há um uso, não consciente, da prostituição para dizer que mulher direita não fuma, não sai de casa sozinha, não assobia na rua, não goza. O médico vai dizer que a mulher não tem muito prazer sexual, ela tem desejo de ser mãe. Já o homem tem e, por isso, precisa da prostituta, afirma Margareth.
De acordo com Margareth, é nessa época que as prostitutas passam a ser condenadas como anormais, patológicas, sem-vergonhas; uma sub-raça incapaz de cidadania. E a justificativa vai vir de teorias médico-científicas. O que acontece é que a medicina do século XVIII usa os argumentos misógenos de Santo Agostinho e de São Paulo, e fundamenta cientificamente o preconceito contra a prostituta, explica Margareth. Diz que a prostituta é um esgoto seminal, uma mulher que não evoluiu suficientemente. São pessoas que têm o cérebro um pouco diferente, o quadril mais largo, os dedos mais curtos. Criam toda uma tipologia.
Para a autora de Os Prazeres da Noite, podemos diferenciar a imagem que se construiu da prostituta na modernidade para a visão que temos dela hoje em dia: nos últimos 40 anos, mudou muito. O sexo está deixando de ser patológico, de estigmatizar o que pode e o que não pode. Não sei se acontecem mais coisas na cama de casados ou de uma prostituta. A revolução sexual transformou os costumes. Mas a sociedade ainda é conservadora e há forte preconceito contra essas mulheres». In Patrícia Pereira, As prostitutas na História, Jacques Rossiaud, A Prostituição na Idade Média, 1991, Margareth Rago, Os Prazeres da Noite, 2008, Revista Leituras da História, wikipédia, 2009.

Cortesia de RLKdaHistória/JDAC